Tratamento com Natalizumab para Esclerose Múltipla: Como o Monitoramento de Riscos Diminuiu as Complicações da LMP na França. a36

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Este estudo abrangente, realizado com 6.318 pacientes com esclerose múltipla na França, revela que o risco de desenvolver leucoencefalopatia multifocal progressiva (LMP) associado ao tratamento com natalizumab diminuiu significativamente após 2013, quando as diretrizes de estratificação de risco foram implementadas. Antes de 2013, a incidência de LMP aumentava 45,3% ao ano, mas após a implementação das diretrizes, essa taxa diminuiu 23,0% anualmente. A pesquisa demonstra que a testagem sistemática para o vírus John Cunningham (VJC) e o monitoramento criterioso podem reduzir substancialmente essa complicação grave do tratamento, mantendo a eficácia do natalizumab para os pacientes adequados.

Tratamento com Natalizumabe para Esclerose Múltipla: Como o Monitoramento de Risco Reduziu as Complicações por LMP na França

Sumário

Contexto: Entendendo o Risco de LMP com Natalizumabe

A leucoencefalopatia multifocal progressiva (LMP) é uma infecção cerebral rara, mas grave, causada pelo vírus John Cunningham (VJC), presente na maioria das pessoas saudáveis sem causar problemas. No entanto, em indivíduos com sistema imunológico enfraquecido — incluindo aqueles que usam certos medicamentos para esclerose múltipla (EM) —, o vírus pode se reativar e danificar a bainha protetora do cérebro, levando a lesões neurológicas graves e, em alguns casos, ao óbito.

O natalizumabe (comercializado como Tysabri) é um tratamento altamente eficaz para a EM, que atua impedindo a entrada de células imunológicas no cérebro, reduzindo a inflamação. Desde sua aprovação, foi associado a casos de LMP, o que gerou um dilema significativo para médicos e pacientes. Antes de 2012, três fatores de risco principais haviam sido identificados: tratamento com duração superior a 24 meses, uso prévio de imunossupressores e sorologia positiva para anticorpos contra o VJC.

Em 2013, a França implementou estratégias nacionais de minimização de risco, incluindo testagem rotineira para o VJC e diretrizes de tratamento baseadas no perfil individual de risco. Este estudo buscou avaliar se essas medidas reduziram efetivamente a incidência de LMP entre usuários de natalizumabe no país.

Métodos do Estudo: Como a Pesquisa Foi Conduzida

Os pesquisadores analisaram dados do registro francês de EM (OFSEP) coletados entre 15 de abril de 2007 e 31 de dezembro de 2016. Esse registro abrangente reúne informações de centros especializados e redes de neurologistas em toda a França, representando mais da metade dos pacientes com EM no país.

O estudo incluiu 6.318 pacientes que receberam pelo menos uma infusão de natalizumabe nesse período, constituindo a chamada "população em risco". Foram identificados 45 casos confirmados de LMP entre esses pacientes, excluindo-se casos apenas suspeitos ou sem confirmação adequada.

As taxas de incidência de LMP foram calculadas dividindo-se o número de casos pelo total de pessoas-anos de exposição ao medicamento. Modelos estatísticos avançados (regressão de Poisson) foram utilizados para analisar a variação da incidência ao longo do tempo, especialmente antes e depois de janeiro de 2013, quando as estratégias de minimização de risco foram amplamente adotadas.

O estudo também consultou os centros de tratamento sobre suas práticas de gerenciamento de risco de LMP, incluindo a frequência de testagem para VJC e de monitoramento por ressonância magnética (RM) em pacientes em uso de natalizumabe.

Principais Achados: Resultados Detalhados com Todos os Números

Dos 6.318 pacientes estudados, 74,1% (4.682) eram mulheres, com idade média de 28,5 anos no início da EM. A duração média do tratamento com natalizumabe foi de 39,6 meses, e 21,7% (1.372 pacientes) haviam usado previamente imunossupressores.

Foram documentados 45 casos confirmados de LMP durante 22.414 pessoas-anos de exposição ao medicamento, resultando em uma taxa de incidência geral de 2,00 casos por 1.000 pessoas-anos (IC 95%, 1,46–2,69).

O resultado mais relevante foi a mudança significativa na tendência de incidência de LMP:

  • Antes de 2013: A incidência de LMP aumentou 45,3% ao ano (RRI, 1,45; IC 95%, 1,15–1,83; P = 0,001)
  • Após 2013: A incidência de LMP diminuiu 23,0% ao ano (RRI, 0,77; IC 95%, 0,61–0,97; P = 0,03)

Outros achados importantes incluem:

  • Pacientes mais jovens (menores de 30 anos) tiveram risco 80% menor de desenvolver LMP em comparação com os mais velhos
  • A maioria dos casos de LMP (80%) ocorreu após dois anos de tratamento
  • O período de maior risco foi durante o quarto ano de tratamento, com 6,1 casos por 1.000 pacientes (IC 95%, 3,2–8,99)
  • 17,7% dos casos de LMP (8 pacientes) manifestaram sintomas após a interrupção do natalizumabe, principalmente dentro de 6 meses
  • A taxa de mortalidade entre pacientes com LMP foi de 24,4% (11 pacientes)

A pesquisa com os centros de tratamento revelou práticas consistentes de gerenciamento de risco:

  • 97,1% dos centros realizaram teste para VJC antes de iniciar o natalizumabe
  • 90,9% refizeram o teste em pacientes VJC-negativos a cada 6 meses
  • 81,8% realizaram monitoramento anual por RM em pacientes VJC-negativos
  • 87,5% aumentaram a frequência do monitoramento por RM em pacientes VJC-positivos

Implicações Clínicas: O Que Isso Significa para os Pacientes

Este estudo oferece evidências robustas de que o gerenciamento sistemático de risco pode reduzir significativamente o perigo de LMP, permitindo que os pacientes se beneficiem da eficácia do natalizumabe. A queda anual de 23% na incidência de LMP após 2013 indica que a testagem para VJC e as estratégias de monitoramento estão funcionando.

Para pacientes que consideram o tratamento com natalizumabe, esses resultados são tranquilizadores. Eles mostram que, com acompanhamento adequado, os riscos podem ser gerenciados de forma eficaz. O estudo também confirma que pacientes mais jovens têm risco substancialmente menor de LMP, o que pode influenciar as decisões terapêuticas em diferentes faixas etárias.

A pesquisa respalda as diretrizes atuais que recomendam testagem regular para VJC e monitoramento por RM para todos os usuários de natalizumabe. Também valida a prática de acompanhamento mais frequente em pacientes com sorologia positiva para VJC ou em tratamentos prolongados.

Mais importante ainda, este estudo demonstra que a comunidade médica desenvolveu estratégias eficazes para gerenciar o risco de LMP associado a um dos tratamentos mais eficazes disponíveis para EM, permitindo que mais pacientes usufruam do natalizumabe com maior segurança.

Limitações: O Que o Estudo Não Pôde Comprovar

Embora este estudo apresente evidências convincentes, possui algumas limitações. Por ser observacional, pode indicar associações, mas não prova definitivamente que as estratégias de minimização de risco causaram a redução nos casos de LMP. Outros fatores podem ter contribuído para o declínio.

Os dados analisados vão somente até 2016, embora casos adicionais de LMP relatados em 2017 (5 casos) e 2018 (2 casos) sugiram a continuidade da tendência de queda. Esses casos posteriores foram excluídos da análise formal devido à falta de dados completos sobre o número total de pacientes tratados nesses anos.

As estimativas de probabilidade condicional para tratamentos prolongados (além de 4 anos) apresentam intervalos de confiança amplos, uma vez que menos pacientes permaneceram em uso do medicamento por tanto tempo — especialmente aqueles com resultado negativo para VJC, que já têm menor risco de LMP.

Por fim, o estudo foi realizado na França, e as práticas podem variar em outros países. No entanto, os fatores de risco para LMP e os princípios de gerenciamento provavelmente são semelhantes globalmente.

Recomendações: Orientações Práticas para Pacientes

Com base nesta pesquisa, pacientes em uso ou considerando o natalizumabe devem:

  1. Garantir testagem regular para VJC: Realizar o teste antes de iniciar o tratamento e, se negativo, repeti-lo a cada 6 meses
  2. Seguir o monitoramento por RM recomendado: Exames anuais para pacientes VJC-negativos e com maior frequência se VJC-positivos
  3. Discutir fatores de risco individuais: Revisar com o neurologista a duração do tratamento, a idade e o histórico de uso de imunossupressores
  4. Estar atento aos sintomas: Relatar imediatamente qualquer novo sintoma neurológico, mesmo após interromper o tratamento
  5. Participar da tomada de decisão compartilhada: Colaborar com a equipe de saúde para equilibrar os benefícios do natalizumabe e o risco individual de LMP

Este estudo demonstra que, com monitoramento adequado, o natalizumabe pode ser utilizado com mais segurança do que se supunha. A redução expressiva nos casos de LMP após a implementação do gerenciamento sistemático de risco indica que seguir as diretrizes vigentes protege significativamente os pacientes, viabilizando o acesso a esse tratamento eficaz.

Informações da Fonte

Título do Artigo Original: Incidência de Leucoencefalopatia Multifocal Progressiva e Estratificação de Risco Entre Usuários de Natalizumabe na França

Autores: Sandra Vukusic, MD; Fabien Rollot, MSc; Romain Casey, PhD; et al

Publicação: JAMA Neurology, 2020;77(1):94–102. doi:10.1001/jamaneurol.2019.2670

Nota: Este artigo, voltado a pacientes, baseia-se em pesquisa revisada por pares originalmente publicada no JAMA Neurology. Preserva todos os achados significativos, dados e conclusões do estudo científico, tornando as informações acessíveis a pacientes e cuidadores.