Tratamento Prolongado com Ocrelizumab Mantém Benefícios Sustentados em Pacientes com Esclerose Múltipla Recorrente-Remitente ao Longo de 10 Anos. a42

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Este estudo de acompanhamento de 10 anos do ocrelizumabe (Ocrevus) para esclerose múltipla recorrente-remitente demonstra excelente segurança em longo prazo e eficácia sustentada. Os pacientes mantiveram baixa atividade da doença, com taxas anuais de surto inferiores a 0,2 e progressão mínima da incapacidade ao longo da década de observação. É importante destacar que não surgiram novas preocupações de segurança, e não houve evidência de recidiva da doença mesmo após interrupções do tratamento que duraram quase dois anos em alguns casos.

Tratamento de Longo Prazo com Ocrelizumabe Mantém Benefícios por 10 Anos em Pacientes com Esclerose Múltipla Remitente-Recorrente

Sumário

Introdução: Relevância da Pesquisa

A esclerose múltipla é uma doença crônica que demanda estratégias terapêuticas de longo prazo. O ocrelizumabe (comercializado como Ocrevus) é um medicamento aprovado para as formas remitente-recorrente e primariamente progressiva da EM. Este anticorpo monoclonal anti-CD20 age direcionando células B, um tipo de célula imunológica envolvida nos processos inflamatórios da doença.

Estudos anteriores já haviam comprovado a eficácia do ocrelizumabe em prazos mais curtos, mas esta pesquisa traz o acompanhamento mais longo já registrado—acompanhando pacientes por mais de uma década, de 2008 a 2020. Entender a segurança e a eficácia em longo prazo é essencial, já que muitos pacientes precisarão de tratamento por décadas, e tanto eles quanto seus médicos devem saber o que esperar de uma terapia prolongada.

O estudo também investiga o que ocorre quando o tratamento é interrompido—uma situação comum na prática clínica, devido a gravidez, cirurgias ou outros motivos. A pesquisa oferece insights valiosos sobre o tempo de retorno da atividade da doença após a suspensão e a possível ocorrência de efeito rebote, quando a EM se agrava além do nível pré-tratamento.

Métodos: Como o Estudo Foi Realizado

Este estudo internacional incluiu 220 participantes com esclerose múltipla remitente-recorrente (EMRR), recrutados em 79 centros médicos de 20 países. Os critérios de inclusão foram: idade entre 18 e 55 anos, diagnóstico confirmado de EMRR, pelo menos duas recaídas nos últimos três anos (sendo uma no ano anterior) e pontuação entre 1 e 6 na EDSS (Escala Expandida do Estado de Incapacidade).

A pesquisa foi dividida em quatro fases ao longo de mais de dez anos. No período inicial de 96 semanas, os pacientes foram randomizados em quatro grupos: ocrelizumabe 2000 mg, ocrelizumabe 600 mg, placebo ou interferon beta-1a. Após as primeiras 24 semanas, todos receberam ocrelizumabe nas três etapas seguintes.

Depois do tratamento, os participantes entraram em uma fase sem medicação, que incluiu um período monitorado (com avaliações a cada 12 semanas até a normalização das células B) e outro não monitorado. Por fim, 103 pacientes ingressaram na fase de extensão aberta, recebendo ocrelizumabe 600 mg a cada 24 semanas.

Os desfechos analisados incluíram:

  • Atividade na ressonância magnética (lesões captantes de gadolínio e novas lesões T2)
  • Taxa anualizada de recaídas
  • Progressão da incapacidade (avaliada pela EDSS)
  • Eventos adversos e efeitos colaterais graves
  • Contagem de células B e marcadores imunológicos

Segurança: Efeitos Adversos e Riscos

Os dados de segurança de mais de dez anos trazem informações tranquilizadoras para pacientes em tratamento prolongado com ocrelizumabe. Os efeitos adversos mais frequentes foram reações à infusão, infecções, cefaleia e dor lombar.

No período inicial, as taxas de eventos adversos ajustadas por exposição foram similares entre os grupos. A taxa geral foi de 401,1 por 100 pacientes-ano com ocrelizumabe, contra 375,3 com interferon. Eventos graves ocorreram a 24,6 por 100 pacientes-ano com ocrelizumabe, versus 33,8 com interferon.

Reações à infusão foram mais comuns na primeira aplicação (25–35% dos pacientes), mas rarearam após a quarta dose. Não houve registros de leucoencefalopatia multifocal progressiva (LMP), infecção cerebral grave associada a alguns tratamentos para EM.

As taxas de infecção foram levemente superiores durante o tratamento, como esperado com terapias imunomoduladoras. Infecções graves mantiveram-se baixas (1,5–5,5 eventos por 100 pacientes-ano).

Ocorreram dois óbitos: um durante a fase sem tratamento, por síndrome da resposta inflamatória sistêmica em paciente previamente tratado com ocrelizumabe, e outro no grupo do interferon durante o período inicial.

Eficácia: Desempenho do Ocrelizumabe

Os resultados mostram um controle consistente da doença em longo prazo. Na fase de extensão (acompanhamento mediano de 6,5 anos), os pacientes mantiveram resposta terapêutica robusta.

A taxa anualizada de recaídas permaneceu baixa (0,15), equivalendo a aproximadamente uma recaída a cada 6–7 anos.

A progressão da incapacidade também foi bem controlada. O percentual de pacientes com piora confirmada (sustentada por 24 semanas) manteve-se reduzido, mesmo durante a interrupção do tratamento.

Os exames de ressonância magnética revelaram supressão persistente da atividade inflamatória. Lesões captantes de gadolínio (sinal de inflamação ativa) reduziram-se em 89–96% em relação ao placebo no início do estudo, e esse controle manteve-se na extensão.

Importante destacar que não houve evidência de rebote da doença após a interrupção do tratamento. Os primeiros sinais de atividade na ressonância reapareceram 24 semanas após a última dose, e apenas 16,3% dos pacientes apresentaram atividade detectável no período monitorado sem medicação.

Células B: Comportamento das Células Imunes

O ocrelizumabe atua reduzindo células B CD20+, e este estudo detalha a duração desse efeito e a velocidade de recuperação celular após a suspensão.

As células B CD19+ diminuíram rapidamente com o tratamento e permaneceram majoritariamente indetectáveis durante sua administração. Na interrupção, repovoaram gradualmente.

Pacientes que iniciaram com ocrelizumabe apresentaram recuperação mais lenta das células B em comparação aos que começaram com placebo ou interferon. O tempo mediano para atingir 80 células/µL foi maior nos grupos de ocrelizumabe.

No início da extensão, a contagem mediana de células B CD19+ era de 204,0 células/µL (variação: 6,0–646,0), indicando recuperação imunológica após a pausa. Células B de memória (CD19+ CD38lo CD27+) também retornaram, mas em menor número (mediana de 5,0 células/µL).

Com a retomada do ocrelizumabe na extensão, as células B caíram novamente abaixo do nível de detecção, confirmando a ação consistente do medicamento.

Implicações Clínicas: Impacto para Pacientes

Este estudo de longo prazo oferece insights valiosos para pacientes em uso ou considerando o ocrelizumabe. Os dados mostram que o medicamento mantém eficácia por anos, sem perda de benefício.

Para quem precisa interromper temporariamente o tratamento—seja por gravidez, cirurgia ou outros motivos—os achados são tranquilizadores: a doença não retorna imediatamente, e não há agravamento rebote.

O perfil de segurança manteve-se estável, sem novos riscos identificados com o uso prolongado. Reações à infusão, o efeito adverso mais comum, tendem a diminuir após as primeiras aplicações.

O monitoramento das células B ajuda a entender a dinâmica imunológica: a recuperação lenta dessas células explica por que o controle da doença persiste por meses após a última dose.

Limitações: O Que o Estudo Não Mostrou

Embora valioso, o estudo tem limitações. A fase de extensão aberta não foi randomizada ou controlada—todos receberam ocrelizumabe, impossibilitando comparações com outros tratamentos ou com a ausência de terapia.

O número de participantes diminuiu ao longo do tempo (comum em estudos longos). Apenas 103 dos 220 pacientes iniciais ingressaram na extensão, e 86 permaneciam em tratamento no fechamento dos dados. Essa perda amostral pode limitar a generalização dos resultados.

A população estudada era relativamente homogênea (todos com EMRR ativa), e os achados podem não se aplicar a pacientes com doença menos ativa ou outros subtipos de EM.

Como análise exploratória, comparações entre grupos não foram estatisticamente dimensionadas, exigindo cautela na interpretação de diferenças numéricas não testadas.

Recomendações: Orientações Práticas

Com base neste estudo, pacientes em uso ou considerando o ocrelizumabe devem:

  1. Discutir planejamento de longo prazo com seu neurologista, já que a pesquisa confirma segurança e eficácia prolongadas
  2. Estar cientes de que reações à infusão são mais comuns na primeira dose e geralmente amenizam depois
  3. Entender que, se houver interrupção, a proteção pode persistir por meses devido à recuperação lenta das células B
  4. Manter acompanhamento regular conforme orientação médica, incluindo exames de sangue e vigilância para infecções
  5. Relatar quaisquer sintomas novos à equipe de saúde, especialmente sinais infecciosos, como com qualquer terapia imunomoduladora

Esta pesquisa reforça que o ocrelizumabe é uma opção de tratamento viável e sustentável para EMRR, com perfil de segurança consistente. Decisões terapêuticas, no entanto, devem sempre ser individualizadas com o profissional de saúde.

Fonte

Título Original: Exposição ao ocrelizumabe na esclerose múltipla remitente-recorrente: análise de 10 anos do ensaio clínico randomizado de fase 2 e sua extensão

Autores: Ludwig Kappos, Anthony Traboulsee, David K. B. Li, Amit Bar-Or, Frederik Barkhof, Xavier Montalban, David Leppert, Anna Baldinotti, Hans-Martin Schneble, Harold Koendgen, Annette Sauter, Qing Wang, Stephen L. Hauser

Publicação: Journal of Neurology (2023) 271:642–657

Nota: Este artigo de linguagem acessível é baseado em pesquisa original publicada no Journal of Neurology. Seu objetivo é traduzir as descobertas científicas para um formato compreensível, preservando a precisão dos dados do estudo.