A Jornada de uma Jovem com Dor de Garganta Persistente: Entendendo um Diagnóstico Incomum de Câncer.

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Este estudo de caso analisa uma mulher de 29 anos que apresentou dor de garganta persistente, inchaço e sangramento ao longo de sete semanas, apesar de múltiplos tratamentos com antibióticos. Após uma extensa avaliação diagnóstica, sua condição foi finalmente identificada como rabdomiossarcoma embrionário, um tipo raro de câncer de tecidos moles. O caso ressalta a importância de considerar a possibilidade de câncer diante de sintomas de garganta persistentes que não respondem aos tratamentos convencionais e ilustra o processo diagnóstico complexo necessário para um diagnóstico preciso.

A Jornada de uma Mulher Jovem com Dor de Garganta Persistente: Entendendo um Diagnóstico Incomum de Câncer

Sumário

Apresentação do Caso: A História da Paciente

Uma mulher de 29 anos, previamente saudável, chegou ao hospital com sintomas preocupantes na garganta que persistiam há sete semanas. Sua jornada médica começou com uma dor de garganta que não melhorou após uma semana, levando-a a buscar atendimento em uma clínica primária. Os testes iniciais para COVID-19 e faringite estreptocócica deram negativo, e ela foi orientada a repousar e se hidratar.

Nos quatro dias seguintes, a dor de garganta piorou significativamente, tornando-se tão intensa que atrapalhou seu sono. Ela retornou à clínica e recebeu azitromicina, um antibiótico, mas após cinco dias de tratamento, seus sintomas não melhoraram. A dor persistente e o inchaço no lado direito da garganta motivaram uma visita ao pronto-socorro 31 dias antes de sua internação definitiva no Massachusetts General Hospital.

Durante essa visita de emergência, ela descreveu a sensação de que a comida "ficava presa" ao engolir, além de fadiga, mas sem febre, dificuldade para respirar ou outros sintomas sistêmicos. Seus sinais vitais estavam normais: temperatura 36,9°C (98,4°F), pressão arterial 105/77 mm Hg, frequência cardíaca 74 batimentos por minuto e saturação de oxigênio 99% em ar ambiente.

Avaliação Inicial e Tratamento

Os médicos observaram edema (inchaço) e flutuação (área preenchida por líquido) na região periamigdaliana direita (o espaço ao redor das amígdalas), com a úvula (o tecido pendurado na parte posterior da garganta) desviada para a esquerda. Notavelmente, ela não apresentava trismo (rigidez mandibular), aumento de linfonodos ou erupção cutânea. Sua contagem de leucócitos era de 6.700 por microlitro, dentro da faixa normal de 4.000 a 11.000.

O tratamento inicial incluiu amoxicilina-clavulanato, outro antibiótico, após o qual ela recebeu alta com instruções para acompanhamento com um especialista em otorrinolaringologia (ORL). Vinte e seis dias antes de sua internação definitiva, ela foi submetida a um procedimento de incisão e drenagem que produziu 3 ml de líquido sanguinolento em vez de pus.

No dia seguinte, ela retornou com aumento da dor, inchaço e sangramento no local da incisão. Os médicos observaram mais inchaço, equimose (hematoma), mucosa frágil e algum tecido necrótico. Tentaram drenar mais líquido e evacuar um hematoma (acúmulo de sangue), mas o sangramento continuou, exigindo cirurgia de urgência para controlá-lo com agentes especializados.

Processo Diagnóstico e Exames de Imagem

Os exames de imagem foram cruciais para o diagnóstico. Uma tomografia computadorizada (TC) com contraste revelou uma lesão hipodensa (menos densa) medindo 2,6 cm × 2,1 cm × 3,8 cm na região periamigdaliana direita. A massa apresentava realce marginal mínimo e causava estreitamento leve da orofaringe (espaço da garganta).

Um mês depois, uma angiotomografia mostrou que a lesão havia crescido para 3,4 cm × 3,6 cm × 4,6 cm com densidade complexa. Agora estendia-se para o palato mole e a nasofaringe (área superior da garganta atrás do nariz). A massa era inseparável do músculo pterigoideo medial direito, mas não mostrava aumento muscular ou edema.

Os valores laboratoriais na internação definitiva mostraram uma contagem elevada de leucócitos de 13.470 por microlitro (normal: 4.500-11.000) com aumento de neutrófilos (8.970, normal: 1.800-7.700). Sua hemoglobina era de 15,1 g/dL (normal: 12,0-16,0) e hematócrito 44,9% (normal: 36,0-46,0), com contagem de plaquetas e estudos de coagulação normais.

Diagnóstico Diferencial: O Que Poderia Ser?

A equipe médica considerou várias possibilidades para sua condição. Inicialmente, um abscesso periamigdaliano (acúmulo de pus próximo às amígdalas) parecia provável, dados seus sintomas e localização. No entanto, a ausência de febre, trismo, aumento de linfonodos e a falta de pus durante a drenagem tornaram essa hipótese menos provável.

Eles ampliaram as considerações para incluir:

  • Doenças autoimunes como lúpus eritematoso sistêmico ou vasculite
  • Doenças granulomatosas como sarcoidose
  • Distúrbios infiltrativos como amiloidose
  • Tumores benignos incluindo papilomas, fibromas ou tumores de glândulas salivares
  • Cânceres malignos como carcinoma de células escamosas, linfoma, câncer de glândula salivar ou sarcoma

O padrão de crescimento rápido, a tendência ao sangramento e a ausência de envolvimento linfonodal tornaram o sarcoma (um tipo de câncer do tecido conjuntivo) uma hipótese forte. A localização no espaço periamigdaliano, que contém vários tipos de tecidos, tornou vários tipos de câncer possíveis sem confirmação por biópsia.

Achados Patológicos e Diagnóstico

O diagnóstico definitivo veio dos resultados da biópsia. O exame microscópico revelou células tumorais com diferenciação de músculo esquelético. A coloração imuno-histoquímica (testes especiais de tecido) mostrou que as células tumorais eram positivas para desmina e myoD1 (marcadores específicos de músculo), e focalmente positivas para miogenina (outro marcador muscular).

Os testes moleculares foram cruciais para a confirmação. O teste de hibridização in situ por fluorescência (FISH) descartou rearranjos de FOXO1, eliminando efetivamente o rabdomiossarcoma alveolar da consideração. O sequenciamento de próxima geração identificou variantes na via RAS, incluindo mutações nos genes HRAS e GNAS.

O diagnóstico final foi rabdomiossarcoma embrionário, um sarcoma de partes moles raro que tipicamente afeta crianças, mas pode ocasionalmente aparecer em adultos. A análise citogenética revelou um cariótipo complexo incluindo trissomia do cromossomo 8 (um cromossomo 8 extra), que pode ocorrer em casos de rabdomiossarcoma.

Implicações Clínicas para Pacientes

Este caso demonstra vários pontos importantes para pacientes com sintomas persistentes. Primeiro, sintomas de garganta que não respondem à antibioticoterapia adequada merecem investigação adicional além da infecção. A ausência de sinais típicos de infecção como febre ou pus não descarta condições graves.

Segundo, o processo diagnóstico para condições raras frequentemente requer múltiplas abordagens: exame físico, estudos de imagem, testes laboratoriais e, finalmente, biópsia tecidual com testes moleculares especializados. A jornada de sete semanas desde os sintomas iniciais até o diagnóstico destaca como condições raras podem ser complexas de identificar.

Terceiro, o rabdomiossarcoma em adultos é excepcionalmente raro, representando menos de 1% dos cânceres em adultos. Quando ocorre na região de cabeça e pescoço, pode apresentar sintomas que imitam infecções comuns, tornando o diagnóstico desafiador. A detecção precoce é crucial para resultados otimizados do tratamento.

Limitações do Caso

Este relato de caso descreve a experiência de uma única paciente, o que significa que os achados não podem ser generalizados para todos os pacientes com sintomas semelhantes. A raridade do rabdomiossarcoma embrionário em adultos significa que este representa uma apresentação incomum em vez de um cenário comum.

O processo diagnóstico levou várias semanas e múltiplas intervenções, o que pode não refletir o cronograma ideal para identificar tais condições. O caso não fornece informações de acompanhamento de longo prazo sobre resposta ao tratamento ou desfechos, focando em vez disso no desafio diagnóstico.

Além disso, a idade relativamente jovem da paciente e a ausência de fatores de risco típicos para câncer (não fumante, sem uso de álcool) tornaram o câncer uma consideração menos imediata, o que pode atrasar o diagnóstico em casos semelhantes.

Recomendações para Pacientes

Com base neste caso, os pacientes devem:

  1. Buscar reavaliação se os sintomas persistirem além dos prazos esperados apesar do tratamento adequado
  2. Solicitar encaminhamento a especialistas quando tratamentos gerais não resolverem os sintomas
  3. Considerar imagens avançadas quando os achados físicos não corresponderem aos padrões esperados
  4. Entender que a biópsia pode ser necessária quando métodos menos invasivos não fornecerem respostas
  5. Estar cientes de que condições raras podem às vezes explicar sintomas persistentes que não se encaixam em padrões comuns

Para sintomas de garganta persistentes especificamente, os pacientes devem notar que a ausência de sinais típicos de infecção (febre, pus, aumento de linfonodos) pode indicar causas não infecciosas que requerem abordagens diagnósticas diferentes. Sangramento de áreas da garganta, especialmente sem causa clara, sempre merece investigação minuciosa.

Informações da Fonte

Título do Artigo Original: Caso 14-2025: Uma Mulher de 29 Anos com Inchaço e Sangramento Periamigdaliano

Autores: Rahmatullah Wais Rahmati, Katherine L. Reinshagen, Rosh K.V. Sethi, David S. Shulman, Emily M. Hartsough

Publicação: The New England Journal of Medicine, 2025;392:1954-1964

DOI: 10.1056/NEJMcpc2300972

Este artigo para pacientes é baseado em pesquisa revisada por pares dos Registros de Casos do Massachusetts General Hospital.