Ocrelizumabe: Um Guia Completo para Pacientes sobre o Tratamento da Esclerose Múltipla.

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O ocrelizumabe (Ocrevus®) é um tratamento intravenoso eficaz para a esclerose múltipla, reduzindo significativamente as taxas de recaída em 46% a 47% nas formas recorrentes da doença e retardando a progressão da incapacidade em 24% na EM primária progressiva. Os benefícios clínicos se mantêm por mais de 7,5 anos de tratamento, com pacientes recebendo infusões a cada seis meses, o que oferece praticidade. O medicamento é geralmente bem tolerado, sendo as reações relacionadas à infusão e infecções os efeitos adversos mais comuns, geralmente de intensidade leve a moderada.

Ocrelizumabe: Um Guia Abrangente para Pacientes sobre o Tratamento da Esclerose Múltipla

Sumário

Compreendendo a Esclerose Múltipla e o Ocrelizumabe

A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune crônica que afeta o sistema nervoso central, causando inflamação, danos à bainha de mielina (proteção dos nervos) e, com o tempo, lesões nervosas irreversíveis. Cerca de 85% dos pacientes começam com a forma recorrente-remitente da EM (EMRR), caracterizada por surtos de sintomas seguidos por períodos de recuperação. Os demais 10-20% apresentam a forma primária progressiva (EMPP), em que a incapacidade piora gradualmente desde o início, sem fases de remissão.

O ocrelizumabe (comercializado como Ocrevus®) é um tratamento intravenoso com anticorpo monoclonal aprovado tanto para as formas recorrentes quanto para a EM primária progressiva. Representa um avanço significativo, especialmente para a EMPP, para a qual nenhuma outra terapia modificadora da doença havia sido aprovada anteriormente. O medicamento age direcionando células imunológicas específicas, as células B, que hoje se sabe ter um papel crucial na progressão da EM.

Como o Ocrelizumabe Funciona

O ocrelizumabe atua de forma seletiva sobre as células B CD20+, eliminando-as por meio de mecanismos como citotoxicidade celular dependente de anticorpo, citotoxicidade dependente de complemento e apoptose (morte celular programada). Essa ação direcionada poupa a capacidade do organismo de repor as células B no futuro, preserva a imunidade existente e modula eficazmente a resposta imunológica envolvida na progressão da EM.

O medicamento reduz as células B CD19+ (marcador para células B CD20+) a níveis quase indetectáveis em 14 dias após a infusão, mantendo essa redução durante todo o tratamento em 96% dos pacientes. Após a interrupção, a mediana de tempo para as células B voltarem ao normal é de 72 semanas (variando de 27 a 175 semanas). O tratamento também diminui significativamente as células B no líquido cefalorraquidiano e os níveis de cadeia leve de neurofilamento (indicador de dano neural) nas formas recorrentes e progressivas da EM.

O ocrelizumabe tem meia-vida de eliminação de 26 dias e é metabolizado pelos processos naturais do organismo. Não requer ajuste de dose para função hepática ou renal, nem para pacientes com mais de 55 anos.

Eficácia na Esclerose Múltipla Recorrente-Remitente

A eficácia do ocrelizumabe na EM recorrente foi comprovada em dois ensaios de fase III chamados OPERA I e OPERA II, com 1.656 pacientes no total. Os estudos compararam ocrelizumabe com interferon β-1a ao longo de 96 semanas (cerca de 2 anos). Os participantes tinham entre 18 e 55 anos, com escores de 0 a 5,5 na Escala Expandida do Estado de Incapacidade (EDSS), e cerca de 75% não haviam usado terapia modificadora da doença nos 2 anos anteriores.

O ocrelizumabe mostrou resultados expressivos, reduzindo a taxa anual de surtos em 46% no OPERA I e 47% no OPERA II em comparação com interferon β-1a. Especificamente, a taxa de surto foi de 0,16 com ocrelizumabe versus 0,29 com interferon em ambos os ensaios, uma diferença estatisticamente significativa (p < 0,001). Os benefícios foram consistentes na maioria dos subgrupos, independentemente de idade, sexo, IMC, nível basal de incapacidade ou achados de ressonância magnética.

O tratamento também melhorou significativamente outras medidas importantes:

  • Progressão da incapacidade: Redução de 40% no risco de progressão confirmada em 12 semanas (9,1% vs 13,6% com interferon)
  • Melhora da incapacidade: Aumento de 33% na proporção de pacientes com melhora (20,7% vs 15,6%)
  • Atividade na ressonância magnética: Redução de 94-95% nas lesões captantes de gadolínio (0,02 vs 0,29-0,42 lesões por exame)
  • Novas lesões: Redução de 77-83% nas lesões T2 novas ou em expansão (0,32-0,33 vs 1,41-1,90 lesões)

Outros estudos, como ENSEMBLE (pacientes sem tratamento prévio), ENCORE (pacientes tratados com natalizumabe), CHORDS e CASTING (pacientes com resposta insatisfatória a terapias anteriores), confirmaram consistentemente os benefícios do ocrelizumabe.

Eficácia na Esclerose Múltipla Primária Progressiva

O ensaio ORATORIO avaliou o ocrelizumabe em 732 pacientes com EM primária progressiva por pelo menos 120 semanas (cerca de 2,5 anos). Os participantes tinham escores EDSS entre 3,0 e 6,5 na triagem, e 88% não haviam usado terapia modificadora da doença nos 2 anos anteriores.

O ocrelizumabe demonstrou benefícios significativos na desaceleração da progressão da EMPP, reduzindo o risco de progressão confirmada da incapacidade em 12 semanas em 24% comparado ao placebo (razão de risco 0,76; IC 95% 0,59-0,98; p = 0,03). Os efeitos foram maiores em certos subgrupos, especialmente em pacientes com lesões captantes de gadolínio na linha de base (redução de 35% no risco) e naqueles com 45 anos ou menos (redução de 36% no risco).

Benefícios adicionais incluíram:

  • Velocidade de marcha: Redução de 29% na piora no teste de caminhada de 25 pés
  • Função do membro superior: Redução de 44-45% no risco de progressão no teste do buraco de 9 pinos
  • Medidas de ressonância magnética: Reduções significativas na perda de volume cerebral (33,8% menor) e no volume de lesões T2 (aumento de 3,4% vs 7,4% com placebo)

Resultados do Tratamento em Longo Prazo

Estudos de extensão mostraram que os benefícios do ocrelizumabe se mantêm em tratamentos prolongados. Após os ensaios OPERA iniciais de 2 anos, 89% dos pacientes que continuaram com ocrelizumabe e 88% dos que trocaram de interferon completaram mais 3 anos de tratamento (5 anos no total).

Após 5 anos, os pacientes em uso contínuo de ocrelizumabe apresentaram supressão quase completa da atividade da doença na ressonância magnética, com taxas anuais de lesões captantes de gadolínio de 0,006 (contra 0,017 no ano 2) e de lesões T2 novas/em expansão de 0,031 (contra 0,063 no ano 2). Esses pacientes também tiveram menos atrofia cerebral comparados aos que trocaram de interferon.

Após 7,5 anos de acompanhamento (5,5 anos na extensão), a taxa anualizada de surto permaneceu muito baixa, em 0,03, tanto no grupo de uso contínuo quanto no que trocou de interferon. Os pacientes em ocrelizumabe contínuo tiveram risco 23% menor de progressão da incapacidade e 35% menor de necessitar auxílio para caminhar.

Segurança e Efeitos Adversos

O ocrelizumabe é geralmente bem tolerado, com perfil de segurança consistente em ensaios clínicos e na prática real. Os eventos adversos mais comuns incluem:

  • Reações à infusão: Ocorrem em 34-40% dos pacientes na primeira infusão, caindo para 20-25% nas seguintes, na maioria leves a moderadas
  • Infecções: Principalmente infecções respiratórias e urinárias, geralmente leves a moderadas
  • Outros efeitos: Como tosse, fadiga e problemas de pele

Infecções graves ocorreram em 1,3-5,5% dos pacientes com ocrelizumabe versus 0,8-2,9% com tratamentos comparadores. Não houve aumento no risco de câncer comparado aos grupos de interferon ou placebo. Recomenda-se monitoramento regular devido aos efeitos imunossupressores.

Informações Práticas sobre o Tratamento

O ocrelizumabe é administrado por infusão intravenosa a cada seis meses, oferecendo uma posologia conveniente. A dose inicial consiste em duas infusões de 300 mg com intervalo de 14 dias, seguidas por infusões únicas de 600 mg a cada 24 semanas. O tempo de infusão é de cerca de 2 horas para a dose de 600 mg após a inicial.

Considerações importantes para pacientes:

  1. Vacinações: Vacinas inativadas devem ser aplicadas pelo menos 2-4 semanas antes do início do tratamento, se possível
  2. Vacinas vivas: Não recomendadas durante o tratamento ou até a recuperação das células B após a interrupção
  3. Gravidez: Bebês de mães tratadas não devem receber vacinas vivas até a recuperação das células B
  4. Outras medicações: Uso concomitante com outros imunossupressores geralmente não é recomendado

Antes de iniciar, os pacientes devem fazer triagem para hepatite B e outras infecções, além de completar vacinas necessárias.

Limitações dos Estudos

Embora os dados clínicos sejam extensos, algumas limitações devem ser consideradas. Os ensaios OPERA compararam ocrelizumabe com interferon β-1a em vez de placebo, o que, embora ethical, dificulta comparações diretas com tratamentos mais recentes. O ensaio ORATORIO na EMPP não teve poder estatístico para detectar diferenças em todos os subgrupos, limitando algumas análises.

Além disso, embora haja dados de até 7,5 anos, informações de segurança e eficácia em prazos ainda mais longos são importantes, já que pacientes podem usar o medicamento por décadas. Evidências do mundo real, embora alinhadas com os ensaios, continuam a ser acumuladas e trarão insights sobre o desempenho em populações diversificadas.

Recomendações para Pacientes

Com base nas evidências, o ocrelizumabe é uma opção importante tanto para EM recorrente-remitente quanto primária progressiva. Para formas recorrentes, oferece alta eficácia com posologia conveniente a cada seis meses. Para EMPP, é a primeira terapia modificadora da doença aprovada que pode desacelerar significativamente a progressão.

Pacientes que consideram o ocrelizumabe devem:

  • Discutir seu histórico médico completo com o neurologista, incluindo infecções ou câncer
  • Completar vacinas recomendadas antes do início do tratamento, se possível
  • Entender o processo de infusão e possíveis efeitos adversos
  • Comprometer-se com monitoramento regular e consultas de acompanhamento
  • Relatar prontamente sinais de infecção ao profissional de saúde

A conveniência da dosagem semestral, combinada com eficácia robusta e perfil de segurança geralmente manejável, faz do ocrelizumabe uma opção valiosa para o manejo da EM a longo prazo.

Informações da Fonte

Título Original do Artigo: Ocrelizumabe: Uma Revisão em Esclerose Múltipla
Autora: Yvette N. Lamb
Publicação: Drugs (2022) 82:323–334
DOI: https://doi.org/10.1007/s40265-022-01672-9
Aceito: 12 de janeiro de 2022 / Publicado online: 22 de fevereiro de 2022

Este artigo de linguagem acessível baseia-se em pesquisas revisadas por pares e busca representar com precisão os achados científicos, tornando-os compreensíveis para pacientes. As informações devem ser discutidas com profissionais de saúde para decisões sobre tratamento.